Ontem antes de entrar em casa à noite, depois do trabalho, fui ao café comprar aquele pão de Mafra delicioso e quentinho que lá vendem e que é tão bom com manteiga assim que chego a casa. Mais uma vez, era o último. Àquela hora a que costumo ir (21h), é impossível saber se ainda há ou não há pão. Quando entrei no estabelecimento, vinha um polícia a sair com o penúltimo pão de Mafra consigo. No balcão estava outro polícia a preparar-se para sair também. Eu disse "Boa noite!" e este respondeu da mesma maneira. Mal me aproximei do balcão senti que algo não estava como devia ser. Reparei, então, que estava um pequeno cinzeiro em cima com uma beata apagada lá dentro. Tirei logo as minhas conclusões. Mas, só para ter a certeza, confirmei à saída o que já esperava. Na montra, está bem visível o sinal de proibição de fumar decorrente da lei que entrou em vigor no dia um de Janeiro de 2008. Não vi ninguém a fumar mas os indícios estavam lá e não estou a ver o empregado do café a deixar outra pessoa violar a lei senão a polícia, da qual deve recear qualquer coisa... Estou muito indignado e cada vez mais perto de ser anarquista. Com os exemplos que as autoridades dão, quem é que as pode respeitar? Como é que é possível que, numa sociedade de direito, livre e igualitária, ainda haja quem julgue que está acima da lei? E que as autoridades ainda despertem o medo ou a complacência em certas pessoas ao ponto de estas serem cúmplices no incumprimento da lei? Tenham todos vergonha!
Hoje, levantei-me, lavei-me e fui à rua levantar dinheiro e comprar pão. Quando cheguei à caixa do Multibanco tinham acabado de chegar uma mulher de calças de fato de treino escuras e sapatos de vela com um miúdo atrás e, quase ao mesmo tempo, um homem de meia idade com barba de três dias e vestuário casual. Na realidade, chegámos todos quase em simultâneo, mas enquanto a mulher já fazia a operação na máquina, o homem colocou-se atrás junto à berma do passeio - apesar de este ser bem largo - não me restando outra possibilidade senão a de me pôr ao lado dele, um bocado afastado, na diagonal para a caixa. Então, enquanto a mulher continuava de costas para nós, a criança - com aparência de ter entre dois a três anos, com um blusão e um boné azuis escuros - foi-se mexendo muito devagarinho e, voltando-se pouco a pouco, descobriu para nós o olho direito todo inchado, negro, quase todo fechado. O outro homem e eu cruzámos olhares e tenho a certeza que pensámos o mesmo: Esta criança levou um valente murro. Não havia dúvida. O miúdo fixou-me, mas eu não tinha a certeza se ele me via, pois, mesmo com o olho esquerdo bom, parecia distante. E a minha mente estava mais ocupada a pensar a mil à hora noutra causa possível para aquilo, não querendo acreditar que tivesse mesmo sido uma surra. A mulher desviou-se e acenou ao homem para vir. Ele foi e disse qualquer coisa amigável fazendo uma festa na cara da criança. A mulher respondeu com uma lamúria qualquer, só que eu não consegui ouvir nada. Continuou à espera não sei de quê, perto da caixa. O homem fez o que tinha a fazer e, ao sair do sítio, voltou a dizer algo do género: "Tens aí um lindo trabalho" ironicamente para a criança. A mulher replicou qualquer coisa como: "Oh que trabalho!" laconicamente. O homem, antes de partir de vez, ainda me olhou nos olhos novamente e houve de novo aquela comunicação silenciosa, triste, impotente, de precisar de ajuda mas não saber como, de adivinhar o que se passa mas não poder fazer nada, de procurar em alguém a mesma compreensão dos acontecimentos, 2+2=0. A mulher também me deu passagem para usar a caixa. Levantei o meu dinheiro e agradeci. Um olho negro, fechado, inchado, irreconhecível e descaracterizado é das imagens mais feias que pode haver. Dificilmente sai da memória. Só espero que um vizinho de coração forte faça o que puder para pôr cobro ao infortúnio desta pobre criança. Ou então, o melhor era não termos razão, nem o homem do multibanco nem eu, e estarmos completamente enganados e o motivo do inchaço ser uma coisa tão absurda que nem nos passe pela cabeça e só possa ser verdade porque ninguém inventaria semelhante desculpa.
A SIDA é uma doença muito injusta como qualquer doença. E como qualquer doença, ainda é mais injusta quando afecta as crianças. Onde está Deus quando uma criança sofre? Quererá Ele com isso ensinar-nos alguma coisa? Exactamente o quê e porquê com a criança, oh Deus? Porque é que lhe complicas a vida tão depressa como lha dás? Faz algum sentido ou andas só a brincar connosco?
I don't want to start any blasphemous rumours But I think that God's got a sick sense of humour And when I die I expect to find him laughing
id="BLOGGER_PHOTO_ID_5136011334046486242" /> Para quem ainda não conheça, "Humoral da História" é uma rúbrica do Expresso online com cartoons da autoria do jovem talento Rodrigo de Matos. O humor simples, directo, bem delineado e incisivo, mordaz e acutilante, para rir e pôr questões. A seguir com atenção.
Depois de rever o video de Walking In My Shoes, fiquei nostálgico e resolvi hoje ouvir um dos discos dos DM ao acaso e peguei no Black Celebration, de 1986. Canções negras, desesperadas, desoladas ou inconformadas, são todas extremamente bonitas e sempre actuais, mesmo a nível instrumental. Eis que chega Stripped, uma das faixas mais emblemáticas deste álbum. Mal começou a rodar, lembrei-me logo da poderosa versão realizada no tributo aos DM - For The Masses, de 1998. O cover de Stripped coube aos Rammstein, que o incluíram no seu próprio disco e o promoveram com um video igualmente belíssimo. Há quem diga que o video, composto por imagens do filme Olympia de Leni Riefenstahl (que documenta os Jogos Olímpicos de 1936 em Berlim), faz a apologia do nazismo alemão. Eu não acredito e acho que é preciso fazer uma releitura das imagens no seu contexto actual. Sobretudo, ancorando-as na canção, que diz exactamente para "tomares decisões sem a tua televisão", aludindo ao veículo de propaganda política primordial daquela época (ainda hoje). Assim, as imagens fazem todo o sentido, como alerta, apontando directamente para um exemplo do que outrora influenciou as massas sem espírito crítico. "Deixa-me ver-te despido", o refrão, apela ao conhecimento íntimo da pessoa, da sua essência e não do que se vê por fora, que se "vestiu" por influência da sociedade. Mais uma vez, é a tentativa de compreender e ser empático. Seja como for, as imagens são de uma beleza única - Riefenstahl foi brilhante na execução de técnicas de rodagem inovadoras e revelou ter uma grande sensibilidade estética. No caso dos Rammstein, a montagem sincronizada com a música é excelente e alguns efeitos especiais dão o último toque, principalmente na sequência final dos mergulhos em altura, a melhor parte para mim. Apreciem:
Come with me Into the trees We'll lay on the grass And let the hours pass
Take my hand Come back to the land Let's get away Just for one day
Let me see you Stripped (down to the bone) Let me see you Stripped (down to the bone)
Metropolis Has nothing on this You're breathing in fumes I taste when we kiss
Take my hand Come back to the land Where everything's ours For a few hours
Let me see you Stripped (down to the bone) Let me see you Stripped (down to the bone)
Let me hear you Make decisions Without your television Let me hear you speaking Just for me
Let me see you Stripped (down to the bone let me hear you crying Just for me)
...Tenta pôr-te no meu lugar. A canção que vou apresentar é talvez a minha canção favorita para sempre. Quando a oiço, já sei quando é que me vou arrepiar, em que parte me emociono e em que parte paro para pensar. É também a canção com um dos videos mais bonitos que já vi e que realça toda a obra musical. É um video misterioso e profundo e, se ligarmos à letra, mostra pessoas que têm medo de serem julgadas. Como eu. Desde que ouvi esta canção pela primeira vez, apetece-me apresentá-la a quem não me compreende. É tudo uma questão de empatia. Surgiu agora a discussão em torno da campanha orgulho hetero da cerveja Tagus. A certa altura, os argumentos desviaram-se da campanha em si e concentraram-se na questão do orgulho, mais precisamente do orgulho gay. Não me quero alongar sobre este assunto. Queria apenas lembrar que o orgulho é uma faca de dois gumes. Serve para lutar mas, se se perde o tino, acaba por atingir o orgulhoso. Quanto maior for o orgulho menor é o campo de visão e mais difícil é ver o outro lado. E isto aplica-se a qualquer das partes, pois, parece que há aqui uma rivalidade entre identidades sexuais. O ideal era baixarmos todos o orgulho e vivermos em paz, tentando conhecer os passos do estranho ao nosso lado e, se para isso for preciso, "andar com os seus sapatos" (em português, a expressão idiomática mais próxima será "vestir a sua pele"). Com a perfeita compreensão uns dos outros, poder-se-á alcançar uma união. Mas quem é que deve compreender quem primeiro e porquê? Não havendo uma resposta certa a esta pergunta, devia "ganhar" quem mais tenta compreender e não quem se fecha no seu próprio orgulho. Paradoxalmente, quem mais compreende é quem geralmente menos compreendido é. Por isso, contra a discriminação o que importa é tentar fazer compreender e uma das maneiras de chegar a bom porto é criando empatia. No fim, ganhamos todos.
"Walking in My Shoes" é o vigésimo oitavo single britânico dos Depeche Mode, posto à venda no dia 26 de Abril de 1993, e o segundo single para o álbum Songs of Faith and Devotion.
I would tell you about the things They put me through The pain I've been subjected to But the lord himself would blush The countless feasts laid at my feet Forbidden fruits for me to eat But I think your pulse would start to rush
Now I'm not looking for absolution Forgiveness for the things I do But before you come to any conclusions Try walking in my shoes Try walking in my shoes
You'll stumble in my footsteps Keep the same appointments I kept If you try walking in my shoes If you try walking in my shoes
Morality would frown upon Decency look down upon The scapegoat fates made of me But I promise now, my judge and jurors My intentions couldn't have been purer My case is easy to see
I'm not looking for a clearer conscience Peace of mind after what I've been through And before we talk of any repentance Try walking in my shoes Try walking in my shoes
You'll stumble in my footsteps Keep the same appointments I kept If you try walking in my shoes If you try walking in my shoes Try walking in my shoes
Now I'm not looking for absolution Forgiveness for the things I do But before you come to any conclusions Try walking in my shoes Try walking in my shoes
You'll stumble in my footsteps Keep the same appointments I kept If you try walking in my shoes
You'll stumble in my footsteps Keep the same appointments I kept If you try walking in my shoes Try walking in my shoes If you try walking in my shoes Try walking in my shoes
A notícia "Tribunal da Relação deu razão a despedimento de cozinheiro com HIV" (in Público, edição online, 18.11.2007) é chocante. Só tenho a dizer isto: Os senhores que estão cheios de medo de comer num restaurante cujo cozinheiro é seropositivo por acaso conhecem todos os cozinheiros de todos os restaurantes onde vão? Parece que é isso que querem dizer. Ou então, nunca comem fora! Eu vou muitas vezes comer em casa de um amigo, seropositivo, que cozinha muito bem, e (pasmem-se) ainda não contraí a doença. Será que é porque só nos rimos e ele nunca derramou lágrimas para cima de mim? De chorar é a ignorância dos mais altos cargos deste país. É uma insensatez. Não há direito. É triste ver coisas destas acontecerem mas ainda bem que são divulgadas. Só espero é que as vozes da razão sejam mais fortes do que a expressão da ignorância - o medo.
Depois de ver Across The Universe, com um foco na guerra do Vietname, e antes de escrever Este Inverno, debruçado sobre a minha guerra interior, importa aqui relembrar que todas as guerras são injustas e frias para quem há sempre um piano.
Este é um bom exemplo de campanha de sensibilização para os adultos. E como os bons exemplos são para ser seguidos, espero que apareçam mais campanhas como esta porque há muitos adultos que se portam pior que as crianças.